domingo, 22 de julho de 2007

La Rondine. do Verismo e do Amor



La Rondine é uma peça lírica criada por G. Puccini, quando o compositor se encontrava em plena maturidde artística. Seguiram-se-lhe Il Trittico e Turandot, esta última concluída e estreada postumamente.


Estranhamente, La Rondine goza de pouca divulgação junto do público, ao ponto de ser considerada uma ópera periférica!


Pessoalmente, pelo profundo lirismo que encerra, situo-a ao nível de uma La Bohème. Numa e noutra se exalta o amor profundo, carnal e terreno, depurado dos excessos do romantismo, que o reservava à esfera da aristocracia.


A grande virtude do Verismo – de que a lírica pucciniana constitui o paradigma – reside, justamente, no estatuto conferido ao povo, que doravante ocupa o centro da trama.


O universo verista conta com tísicas e putas, perversos e desumanos, proscritos e excomungados, entre outros, sendo animado por sentimentos e vivências que o romantismo se esforçara por reprimir. O ódio conquista o seu espaço, a miséria sobe ao palco e a decadência triunfa.


La Rondine
(à semelhança de La Bohème, aliás) versa sobre um amor singelo e absolutamente humano, mundano até ao âmago.


Ambas as óperas apresentam uma semelhança adicional: as personagens principais apoiam-se em egos auxiliares – outras personagens, secundárias, que dão suporte às primárias. Assim, em La Bohème, Mimi socorre-se de Musetta e Rudolfo de Marcello, enquanto que, em La Rondine, Magda se sustenta em Lisette.


Não existiria lírica sem amores desavindos, posto que de amores perfeitos não reza a ópera! Com ou sem exageros, o amor é etéreo e (com frequência) passageiro…


Ora, no caso do Verismo – e, sublinho, La Rondine é uma ópera verista! – o amor e suas vicissitudes encontram-se subordinados aos ditames da (dura e cruel) realidade: as amadas sucumbem à tísica, os amados enamoram-se de mulheres dignas, destroem-se uniões – antes mesmo de se consumarem -, quando se revelam passados comprometedores, etc., etc.


Sem surpresa, nesta ópera de Puccini, desde início, adivinha-se um desenlace trágico. Magda é uma andorinha, condenada à errância.


Nesta extraordinária interpretação, sublinho o engagement de Gheorghiu e Alagna, plenamente entregues à paixão e amor, que vivem e expressam com invulgar fulgor e arrebatamento: Angela Gheorghiu, pela força dramática da sua leitura interpretativa, faz-nos esquecer as suas fragilidades técnicas (pianissimi titubeantes); Alagna, cristalino e imensamente lírico, traça-nos um Ruggero de coração cheio e palpitante.


Os que amam e conhecem a verdadeira paixão rever-se-ão, sem sombra de dúvida, nas magistrais leituras propostas pelo par lírico dos anos 1990! O que o dito par fez depois – e, sobretudo, à côté -, é coisa de mexericos e tricas que a lírica ignora!


Que se dê a mão à palmatória! Serei o único??

2 comentários:

Anónimo disse...

Não é o único, com certeza! Sou um deles. Trata-se de uma ópera lindíssima, requintadíssima do ponto de vista melódico, de uma delicadeza e simplicidade admiráveis. Subscrevo totalmente as suas referências à interpretação que recomenda. Admirável a harmonia transmitida pelo par de protagonistas e acrescendo a delícia que é escutar a orquestra e o coro. Trata-se de uma gravação premiada, sem dúvida, com mérito.

Filipe

Anónimo disse...

Muito de acordo em muito do comentário do João e do Filipe.
A melodia flui inteligentemente sugerida aqui e acolá no tecido musical. Por que razão não se afirmou? As linhas melódicas são belas, sem dúvida, mas não tão belas como as das quatro grandes óperas de Puccini. Até mesmo o Sogno di Doretta, linha melódica que extravasa a ária, não se pode comparar com as duas árias da protagonista da Manon Lescaut, ópera um bocado enfadonha, mas que de certo modo se impôs.
Estamos perante uma injustiça? Acho que sim e que a ópera merece uma reabilitação. Existem, no entanto,outras que também o merecem e que são superiores a La Rondine e que são o Benvenuto Cellini de Berlioz e a Medea in Corinto de Mayr.
Raul